Sinto que sou estátua
Toda feita de pedras sobrepostas besuntadas com uma fina camada de reboco
Um eu encaixado e rebocado
Cada dia que passa cai de mim um pouco do reboco
Por dentro dessa eu-estátua tem outro eu
O eu eu-mesma
Toda vez que cai o reboco,
um pedregulho fica exposto e ao cair vira pó
Fica tudo exposto, até o osso
Dor, frio, raiva, medo
Escapam pela falha
Vou deteriorando com o tempo
Num esforço solitário, rapidamente junto os pedaços caídos
Coloco de volta sem saber ao certo de onde caíram,
Coloco onde cabe, onde alcanço
Sem perceber, deixo partes abarrotadas de pedregulhos
Enquanto outras permanecem expostas e vulneráveis a qualquer tipo de intempéries
Cata, cata
Põe, põe
Pedras que viraram pó só poderão ser cimentadas com água
Mas onde eu arrumo água?
Estátuas choram?
De repente, se lagrimar, eu consiga colar-me um pouco afinal.
Grace Borges. Rio-grandina de presença e alma. Devoradora de palavras, arrisca alguns poemas quando lhe dói, uns contos quando com raiva e crônicas quando a cabeça está cheia. Formada em História Bacharelado e Licenciatura, promete que não é doida. Professora de escola pública. Possui praticamente uma única rede social, o Instagram, onde publica algumas fotos, suas leituras e seus textos desde 2016.
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